Prática antissindical na Águas de Joinville

Em 28 de fevereiro de 2013, a atual direção do Sindicato dos Trabalhadores em Empresas de Serviços de Água e Esgotos Sanitários de Joinville (Sintraej) assumiu seu mandato. Logo após a primeira reunião com a direção da Águas de Joinville, ocorrida no dia 1º de março, a empresa abriu um inquérito e afastou do trabalho o presidente da entidade, Fernando Marcelo da Rosa, 31 anos.  A atitude foi nitidamente antissindical e a Justiça determinou a reintegração dele. O Sinsej entrevistou o dirigente sindical uma semana após o seu retorno ao trabalho.

Sinsej – Fernando, conte-nos o que levou ao seu afastamento?

Fernando – Tivemos uma reunião de diretoria em que levantamos algumas questões preocupantes, por exemplo câmeras escondidas dentro da empresa. Explicamos do que os trabalhadores reclamavam e apresentamos fotos. Acho que aquilo gerou uma ideia de “estes caras vão incomodar, então é melhor darmos um jeito neles o quanto antes”. No dia seguinte nasceu a minha filha, entrei em licença e emendei com férias. No meu terceiro dia em férias me chamaram dizendo que aconteceu um problema. Fui lá e estavam com os documentos prontos para me suspender e ajuizar um inquérito alegando falta grave por fraude, adulteração de documentos, um monte de coisas. Na verdade, o que aconteceu é que eu trabalho na área de TI e outro funcionário me pediu um relatório dos chamados que foram abertos para ele. Esta é uma coisa trivial, banal, que é pedida aos montes diariamente. Ele acabou anexando este documento a uma ação que tinha contra a empresa, de desvio de função. Eles alegaram que aquilo era quebra de confiança e que mereceria um inquérito. Fizeram uma sindicância interna para a qual nem me chamaram. Simplesmente anexaram na hora de ajuizar a ação, não me deram chance de defesa nem nada. Chegaram deixando bem claro que eu estava sendo suspenso porque eu sabia que o cara tinha uma ação contra a empresa. Eu não tenho como saber o que cada um vai fazer com um documento que eu passar. Se fosse um documento ilegal ou se ele tivesse pedido um relatório de outra pessoa, tudo bem. Agora, uma coisa que é para você, que é pertinente a sua função, a sua área, por que isso será negado? Então, de algo banal fizeram tudo isso e ainda, para ajudar, todos os gerentes, coordenadores e diretores receberam um papelzinho para ler aos funcionários informando que eu estava sendo suspenso, acusando-me de fraude, adulteração e mais um monte de coisas. Fizeram questão de expor o caso, como quem diz “se vocês tentarem qualquer coisa aqui terão o mesmo destino dele”.

Sinsej – Você acredita que isso está relacionado com você ser o presidente do sindicato?

Fernando – Totalmente. Mesmo antes de estar na diretoria eu já participava ativamente do sindicato. Chamava o pessoal para a assembleia, estava sempre no bolo para fazer a coisa acontecer. Afinal, é para o bem de todos aquilo. Então já tinham alguns olhos que ficavam voltados para mim.

Sinsej – A partir da abertura da ação por parte da empresa, o que você fez?

Fernando – Tivemos que aguardar o ajuizamento. Dentro da própria ação foi feita a reconvenção onde expusemos esta situação, deixamos bem claro que ficava nítido que era uma prática antisindical. Foi pedido o ressarcimento dos danos, pois a exposição do caso foi uma aberração. Qualquer empresa que suspenda um funcionário, por qualquer motivo que seja, não colocará para todo mundo desta forma. Mas foi o que eles fizeram.

Sinsej – Eles chegaram a demitir você?

Fernando – Não. Era justamente o que tentavam, caracterizar uma justa causa para aí, sim, poder me demitir. Eles me afastaram sem remuneração, sem plano de saúde, sem nenhum dos benefícios que os funcionários têm, mas ainda fiquei com minha carteira vinculada. O argumento deles era de que se eu ganhasse a ação eu receberia tudo retroativo. Mas neste meio tempo, poderei pagar minhas contas de água e telefone retroativos? Eu tinha uma filha recém-nascida. Então, não deixa de ser uma forma de punir. Infelizmente a lei é omissa, é muito abrangente, vai da interpretação e, obviamente, a melhor interpretação não é para o lado do trabalhador.

Sinsej – E qual a decisão da Justiça?

Fernando – A Justiça foi bem coerente. A empresa não conseguiu em momento algum justificar o sigilo daquele documento. Para poder demitir alguém por justa causa o documento tem que ser sigiloso. A própria empresa deixou claro que o funcionário poderia ter acesso, que eu poderia ter fornecido, que aquele documento qualquer um teria direito de retirar. Então, o juiz entendeu que isto realmente era uma perseguição. Foi feito algo muito maior do que realmente tinha acontecido. Ele determinou a minha reintegração e determinou uma multa para a empresa pela exposição do caso. Foi curiosa uma das colocações dele, de que a empresa se preocupou com o sigilo de um documento funcional, mas não se importou em momento algum com a exposição do caso para todos os funcionários. Pesa-se muito de um lado e do outro se faz de qualquer jeito. Agora já faz uma semana que retornei ao trabalho.

Sinsej – A empresa ainda pode recorrer?

Fernando – Ela está recorrendo, mas assim que receberam a intimação, à tarde me chamaram. Nós temos mais um funcionário, que é quem recebeu o documento. Ele também é do sindicato e está sofrendo esta mesma punição. Só que a ação dele é agora no início do mês. Ele é acusado de tirar o documento da empresa de forma ilícita e anexar ao processo para tentar obter vantagem. Inclusive ele acabou perdendo a ação de desvio de função. Isto foi mais um fato que descaracterizou a ação contra mim, pois chegaram a alegar improbidade. E que benefício eu tive em fornecer um documento para o funcionário?

Sinsej – Com este resultado da Justiça, o que você gostaria agora de transmitir aos funcionários?

Fernando – Na verdade não precisei passar nada. Só a minha entrada de novo lá, as pessoas já começaram a perceber que têm poder de mobilização, que têm poder de voz e que não precisam aceitar qualquer coisa que a chefia tente impor. Já houve um gerente que falou algumas coisas no setor e os funcionários disseram que iriam me chamar para conversar. Ou seja, já deu um sentimento de vitória para o trabalhador. Principalmente porque o clima dentro da empresa estava muito ruim. Esta gestão que mudou, foram seis meses aproximadamente que desconstruíram todo um clima bom que tinha desde a fundação da empresa. Era na base do terrorismo mesmo, da pressão psicológica. Coisas como o então presidente chegar e apontar “se você faz tal coisa, você é corrupto”, usando termos fortes. Atitudes que não condizem, que são nitidamente para pressionar o trabalhador a ficar no cantinho dele, não se mexer, não falar com ninguém. Agora, com esta situação, eles perceberam que não é bem assim, que não têm todo este poder que alegavam. Então foi uma vitória não só minha, mas dos trabalhadores, pois reforça a consciência.

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