“Não é só pelos 23, é por todos que lutam”
Em 2013, uma onda de protestos tomou conta das ruas no Brasil, o que não acontecia desde o movimento pelo impeachment do presidente Fernando Collor. As manifestações começaram em São Paulo, contra o aumento da passagem de R$ 3 para R$ 3,20. Em 13 de junho de 2013, a Polícia Militar paulista atacou brutalmente manifestantes no cruzamento da Avenida da Consolação com a Rua Maria Antônia – cerca de 150 pessoas foram feridas.
Esse acontecimento despertou revolta e solidariedade por todo o país. A partir disso, a frase “não é só pelos 20 centavos” se espalhou e um levante com diversas outras pautas tomou conta das cidades. O governo Dilma em nada apoiou o movimento, muito pelo contrário, defendeu a repressão feita pelos governantes e os problemas continuaram a existir. A mesma ainda aprovou a Lei Antiterrorismo, que abriu brechas para criminalizar a luta social.
No ano seguinte, em 2014, outro levante de manifestações aconteceu. Dessa vez, o protesto era contra a Copa do Mundo, sediada no Brasil, e os gastos nas construções de estádios em meio à situação econômica do país. Novos confrontos com a polícia aconteceram e mais pessoas foram feridas.
Condenações sem provas
Agora, após cinco anos do início das manifestações, 23 ativistas que participaram dos movimentos recebem sentença sem provas concretas. O aparelho burocrático da repressão atua mais uma vez. O termo “tenho convicção” se tornou o novo “tenho provas”. Uma simples publicação nas redes sociais pode ser usada para incriminar um manifestante.
E foi exatamente o que ocorreu na investigação dos sentenciados. A denúncia contra eles surgiu em 18 de julho de 2014. Depois disso, uma força tarefa começou a vasculhar perfis de redes sociais, grampear telefones, ouvir declarações de integrantes e ex-integrantes de grupos de ativistas, além dos próprios agentes infiltrados. No entanto, nada disso resultou em provas concretas.
Ao fim, a acusação foi de formação de quadrilha, de tentativa de incêndio da Câmara dos Vereadores, de corrupção de menores, de resistência e de posse de material explosivo. A sentença foi baseada, principalmente, no policial infiltrado nas manifestações, que deu um depoimento sobre todas as atividades que, segundo ele, “o grupo teria a intenção de cometer”. O agente, Maurício Alves da Silva, é da Força Nacional de Segurança, subordinada ao Ministério da Justiça.
Em uma única decisão, divulgada em 17 de julho, o Juiz Flávio Itabaiana (27ª Vara Criminal do Rio de Janeiro) condenou os 23 ativistas. Do total, 20 pegaram sentenças de sete anos de prisão, e três de cinco anos e dez meses, pois eram menores de idade na época dos eventos.
O que diz a defesa
O advogado João Tancredo explica que os réus foram às ruas para protestar contra a realização da Copa do Mundo em 2014 e que protestavam contra a corrupção praticada pelo governo do Estado, nas construções e reformas nos estádios. Corrupção essa que foi confirmada, inclusive, com o então governador do Rio, preso e condenado por isso.
Também incriminada no processo, a advogada dos direitos humanos, Eloisa Samy Santiago, que participava do grupo de defesa dos manifestantes reunidos no acampamento “Ocupa Cabral”, explicou a sua condenação em entrevista à Folha:
“A acusação se baseia num único policial infiltrado que diz ter me visto dando ordens para começar a quebradeira num ato pacífico em Copacabana. Eu apresentei 20 testemunhas que só me viram atuando como advogada. Aí vem a pena para todos, sem individualização de conduta”.
Ou seja, a condenação foi feita para o movimento e não para uma ação de um indivíduo.
“Não é difícil lembrar que foi a violência policial que fomentou a radicalização de alguns protestos, e que nenhum agente do Estado foi punido até hoje, mesmo havendo diversos feridos graves e mortes entre manifestantes, fruto da amplamente documentada violência das polícias contra manifestantes pacíficos, jornalistas, adolescentes e idosos”, disse Henrique Apolinário, assessor do Programa de Violência Institucional da ONG de Direitos Humanos Conectas, em entrevista ao jornal Nexo.
Pelo direito de lutar
Essa não é a primeira vez que casos como esse acontecem. Desde o processo do “Mensalão”, mudou a forma como o Judiciário funciona. Ao invés de a acusação provar que alguém é culpado, o acusado precisa provar que é inocente. Isso se mostra cotidianamente, como nos chamados processos da Lava Jato, no processo que condenou Rafael Braga e agora nos processos que sentenciaram os 23 ativistas do Rio.
O Sinsej já se posicionou inúmeras vezes contra o papel totalitário que o Poder Judiciário tem exercido. É preciso enfatizar que não é apenas a Justiça que está falida, é todo o sistema capitalista. Como acreditar em uma sociedade que permite Temer na presidência, sem o mínimo de apoio popular e soterrado em denúncias de corrupção? Em um Congresso que aprova a Reforma Trabalhista e que tenta aprovar a Reforma da Previdência? Em uma Polícia Militar com fortes indícios de envolvimento na execução da vereadora Marielle?
Não é só pelos 23, é por todos que lutam! Está mais do que na hora da classe trabalhadora se levantar e lutar para derrubar esse sistema. Construir uma sociedade mais justa e igualitária. Um governo dos trabalhadores!
Quem são os 23 ativistas condenados?
- Elisa Quadros Pinto Sanzi (Sininho)
- Luiz Carlos Rendeiro Júnior
- Gabriel das Silva Marinho
- Karlayne Moraes da Silva Pinheiro
- Eloisa Samy Santiago
- Igor Mendes da Silva
- Camila Aparecida Rodrigues Jordan
- Igor Pereira D’Icarahy
- Drean Moraes de Moura
- Shirlene Feitoza da Fonseca
- Leonardo Fortini Baroni
- Emerson Raphael Oliveira da Fonseca
- Rafael Rêgo Barros Caruso
- Filipe Proença de Carvalho Moraes
- Pedro Guilherme Mascarenhas Freire
- Felipe Frieb de Carvalho
- Pedro Brandão Maia
- Bruno de Sousa Vieira Machado
- André de Castro Sanchez Basseres
- Joseane Maria Araújo de Freitas
- Rebeca Martins de Souza
- Fábio Raposo Barbosa
- Caio Silva de Souza.