Mobilização dos trabalhadores impede vendas de ações, mas câmara aprova PPP da Águas de Joinville na calada da noite.

Na noite de terça-feira (16/12), a Câmara de Vereadores de Joinville aprovou dois projetos que permitem a contratação de uma Parceria Público-Privada na Companhia Águas de Joinville, entre outras medidas privatistas. 

Trata-se de um contrato de 30 anos para que uma empresa privada implante e opere o sistema de esgotamento sanitário da Vertente Leste, onde vive cerca de 20% da população de Joinville. O Sintraej e o Sinsej acompanharam a tramitação acelerada no Legislativo e reafirmam: não importa o nome que o governo e os vereadores tentem sustentar, repassar serviços públicos para a exploração privada se chama PRIVATIZAÇÃO.

 
Alteração no projeto 296/2025 e vitória da mobilização dos trabalhadores

Durante a tramitação na Câmara, o PL 296/2025 foi alterado, retirando-se a possibilidade de venda de ações da empresa. Anteriormente, o projeto permitia vender até 49,9% das ações votantes para a iniciativa privada e ainda mais ações com direito a dividendos.

Esta foi já uma grande vitória dos trabalhadores, conquistada a partir da mobilização realizada. Ela demonstra a força da classe trabalhadora e mostra que os avanços poderiam ser ainda maiores com ainda mais organização dos trabalhadores.

No entanto, permaneceram nos projetos a possibilidade de contratar PPPs para o esgoto, possibilidade de contratações temporárias, abertura para a financeirização da empresa, entre outros problemas.

 

Aprovação no “apagar das luzes”

Os projetos 296 e 297/2025 foram enviados pelo governo Adriano à Câmara de Vereadores em 29 de setembro. Imediatamente, o Sintraej, com o apoio do Sinsej, organizou uma ampla campanha na cidade, com ações de comunicação, atos e apoios de entidades de classe de todo o país. Uma moção contra a privatização da companhia chegou a ser aprovada pela Alesc. Além disso, mais de 2 mil assinaturas em um abaixo-assinado foram entregues pelos sindicatos na Câmara.

O Sintraej também pediu o uso da Tribuna Livre, espaço historicamente aberto a entidades da cidade que desejam se manifestar no plenário sobre assuntos de relevância da cidade. No entanto, pela primeira vez na história vimos o Legislativo negar esse direito a um sindicato.

Os projetos precisavam passar por três comissões da Câmara para depois serem votados em plenário: Constituição e Justiça, Legislação e Urbanismo. Em um trâmite normal, isso levaria minimamente algumas semanas. Além disso, pela relevância social da Companhia Águas de Joinville, seria democrático que houvesse audiências públicas.

No entanto, mais uma vez como tantas antes nesse governo, a Câmara preferiu apenas homologar os pedidos do prefeito de forma rápida e traiçoeira. Diante dos interesses políticos e financeiros envolvidos na privatização da CAJ não foi de se surpreender que até mesmo vários parlamentares ditos “opositores” do governo tenham votado a favor dos projetos.

 

Linha do tempo da vergonhosa corrida da CVJ

  • Segunda-feira (15/12), os projetos entraram na pauta da primeira comissão, de Constituição e Justiça. A pauta dessa reunião só foi liberada horas antes, impedindo a participação dos diretores do Sintraej, que tiveram o corte da liberação do presidente esse ano e precisam avisar que sairão para trabalho sindical com 24 horas de antecedência. Diretores do Sinsej compareceram e se posicionaram contra o projeto. Mas ambos foram aprovados.

 

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  • Terça-feira (16/12) era o último dia de trabalho legislativo do ano. Teoricamente, não haveria mais reuniões ordinárias da Comissão de Finanças este ano, mas os vereadores convocaram uma reunião extraordinária, com 14 minutos de antecedência. O correto seria designar um relator, que faria seu parecer e apresentaria para votação em uma próxima reunião. Mas os vereadores fizeram tudo isso em uma só reunião. Eles interromperam a comissão, protocolaram um parecer favorável em 10 minutos, e aprovaram. O Sintraej esteve presente e se manifestou contrário aos projetos.

 

 

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  • Poucas horas depois, ainda na terça-feira, o mesmo aconteceu na Comissão de Urbanismo, onde os diretores do Sintraej também se manifestaram e os projetos também foram aprovados rapidamente.
  • Às 17 horas do mesmo dia, os projetos já foram colocados a voto em plenário. A pauta da sessão com os projetos foi divulgada momentos antes do início. O Sintraej fez uma convocação aos trabalhadores, mas a corrida do Legislativo impediu que essa comunicação fosse feita com tempo, como era de direito da categoria e do restante da cidade. Os diretores sindicais e alguns trabalhadores acompanharam a sessão.

 

  • Por volta das 18 horas a sessão foi suspensa para que mais comissões extraordinárias acontecessem. Neste momento, os vereadores tentavam aprovar inúmeros projetos relevantes para a cidade de maneira rápida e sem discussão. O sindicato questionou e foi informado de que não havia previsão de horário de retorno da sessão, em uma clara estratégia de cansar os poucos trabalhadores presentes.  

Diante disso e da comprovação – mais uma vez – de que a Câmara de Vereadores não é um espaço do povo e que apenas trabalha em ampla maioria para aprovar tudo que o governo pede, os trabalhadores se retiraram, por volta das 20 horas.

 

 

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Mais tarde, como esperado, ambos os projetos foram aprovados, com apenas um voto contrário, da vereadora Vanessa, que também solicitou uma audiência pública, mas teve o pedido rejeitado.  

Qual o problema da PPP da Vertente Leste?

O Sintraej, com o apoio do Sinsej, interveio até o fim explicando que, sim, PPP é privatizar. Afinal, trata-se de um contrato de grande dimensão, por três décadas (mais tempo do que a CAJ tem de idade). No modelo adotado, a CAJ continuará como a cara pública diante da cidade, cobrando as tarifas, mas perde todo o controle técnico da área.

Ainda que sejam previstos mecanismos de fiscalização, todo trabalhador da CAJ sabe que hoje já não existem funcionários concursados suficientes para fiscalizar adequadamente todos os serviços já terceirizados. Além disso, no modelo que será adotado, os lucros da empresa privada estão garantidos, mas qualquer prejuízo terá que ser arcado pela companhia e, em última instância, pela prefeitura. É o que se chama de privatizar o lucro e socializar o prejuízo.

Em um possível pedido de reequilíbrio do contrato (reajuste) ou problemas na prestação do serviço, a cidade ficará refém. Vide o que acontece neste exato momento com a energia elétrica em São Paulo. Mesmo com todas as esferas públicas admitindo a necessidade de rompimento de contrato com a Enel, as manchetes explicam que esse processo pode demorar e não é simples.

Por todos os lados estouram notícias de problemas com as concessões de serviços públicos à iniciativa privada. Para citar apenas um, próximo a Joinville, nos últimos dias foi divulgado o resultado da CPI da concessão do esgotamento sanitário de Blumenau. As análises técnicas apresentadas apontam descumprimentos de metas, obras prometidas que não saíram do papel, fragilidades regulatórias e um rombo que supera R$ 400 milhões. A CPI foi criada em julho após denúncias e aumento de quase 16% na tarifa de esgoto. O contrato é com a BRK Ambiental, antiga Odebrecht Ambiental, grupo conhecido pelo envolvimento em corrupção no país. 

E de onde virá o dinheiro para a universalização do saneamento?

A argumentação do governo Novo para a PPP da Vertente Leste é que a Companhia Águas de Joinville chegou ao limite do seu endividamento e não tem mais condições de expandir sozinha as operações. Nos perguntamos: de onde sairá o dinheiro para devolver o investimento, acrescido de lucros, à empresa privada?

E se o problema é liquidez, lembremos que a Companhia repassa milhões à prefeitura todos os anos sem nenhuma contrapartida. E que o governo acaba de aprovar uma “Reforma Administrativa”, que custará cerca de R$ 100 milhões por ano aos cofres públicos, criando dezenas de cargos comissionados para trabalharem como cabos eleitorais e aumentando salários do alto escalão. Em cinco anos esse montante seria suficiente para fazer as obras de expansão do esgoto na Vertente Leste. 

Dizem ainda que a CAJ não tem mais capacidade de endividamento. Mas o PL 296 autoriza a Companhia a emitir valores mobiliários, como debêntures de infraestrutura ou outros títulos, no mercado de capitais. Isso prova que não há intenção de parar o endividamento da empresa. Exemplos em todo o Brasil dão conta de que esse tipo de debêntures estão sendo usadas para transformar empresas de saneamento em instrumentos de remuneração de investidores. A CAJ, uma empresa sólida e lucrativa, é uma “menina dos olhos” do mercado financeiro. E de onde sairá o dinheiro para remunerar bem esses investidores? Da tarifa paga pela população.

É preciso ressaltar que haveria inúmeras alternativas se fosse de interesse do governo manter a CAJ pública, como incorporá-la à administração direta, por exemplo, como uma autarquia ou secretaria. Mas é preciso compreender que este não é o interesse deste governo.  

O Marco do Saneamento, aprovado no governo Bolsonaro e mantido pelo Lula, manda universalizar os serviços até 2033, mas não garante verbas públicas, empurrando as empresas para empréstimos estrangulantes ou para a privatização.

O BNDES, que tem mais da metade dos seus recursos oriundos do Fundo de Amparo ao Trabalhador, tem sido a ponta de lança de defesa do Marco do Saneamento e da privatização do setor. Esse banco não apenas ajuda a montar os projetos que vão a leilão, mas também financia boa parte deles. Desde 2018, já liberou bilhões em empréstimos e promete cobrir até 80% dos custos dos novos empreendimentos, com total prevalência dos valores disponibilizados para empresas privadas.

Conforme a Auditoria Cidadã da Dívida Pública, com base em dados oficiais, em 2024 mais de R$ 1,9 trilhões foram destinados para os juros e amortizações da impagável dívida pública. Este valor representou 42,96% de todo o Orçamento Federal. Enquanto isso, o setor de saneamento recebeu 0,0052% do Orçamento.

Mas não vemos o prefeito Adriano, os vereadores ou a direção da CAJ indo a Brasília pedir a revisão do Marco, a mudança de política do BNDES ou mais recursos públicos diretos. Isso porque eles abraçaram com entusiasmo o modelo privatista. E o povo que pague a tarifa.

O acesso universal à água e ao esgoto estão atrasados há décadas no Brasil e são urgentes. O problema é que, no modelo privado do Marco, esse objetivo não será alcançado. Atualmente, estima-se que no ritmo atual de investimento x obras a universalização no Brasil só será alcançada em 2070.

 

A continuidade da luta

A retirada da possibilidade de venda das ações da companhia foi uma grande vitória, resultado da mobilização, e mostra até onde a classe trabalhadora pode chegar se ela estiver organizada. A vergonhosa corrida da Câmara para aprovar os projetos mostra o medo de dar tempo de os trabalhadores entenderem o que acontece no Legislativo.

Leis são aprovadas e revogadas todos os dias. Essa foi só mais uma batalha. Nossa luta contra essa PPP, contra a privatização da CAJ e de todos os serviços públicos segue.

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Participe das atividades convocadas!

 

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