A Prefeitura e a Lei de Responsabilidade Fiscal

Em 2010, o prefeito Carlito Merss também não quis conceder reajuste aos servidores municipais. A justificativa era a mesma, a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Em agosto do ano passado, os gastos com o funcionalismo consumiam 51,39% da Receita Corrente Líquida (RCL) da Prefeitura. A greve fez com que o prefeito concedesse o aumento. Em janeiro de 2011, depois de incorporado o reajuste de 5,49% e ainda pagando os três abonos de R$ 220, o gasto com a folha de pagamento caiu para 48,7%.

Este ano, o prefeito insiste no mesmo discurso. Na comparação entre os primeiros bimestres de 2009 e 2010, a receita da Prefeitura cresceu mais de 20%. Só de dezembro a janeiro o aumento foi de mais de R$ 18 milhões. Com um orçamento previsto de mais de R$ 1,5 bilhão para 2011, a Prefeitura alega ainda que a sua “proposta” – de não conceder reajuste em 2011 – custará R$ 39 milhões aos cofres municipais.

O Tribunal de Contas do Estado (TCE) aponta que entre o que a Prefeitura gastou com pessoal ao fim de 2010 e o que ela ainda pode gastar, há um saldo de mais R$ 45 milhões. O gasto previsto somente com o reajuste até o fim do ano soma menos de R$ 20 milhões. Comparando com os dados da receita de 2010, esse montante não ultrapassa 50% dos gastos da RCL, ficando abaixo do limite prudencial da LRF, que é de 52%.

O cenário desenhado por Carlito Merss é dos piores possíveis e irreal. A LRF prevê punições ao chefe do Executivo somente em casos extremos. Até hoje no Brasil ocorreram apenas aplicações de multas que não ultrapassaram R$ 20 mil e, ainda assim, foram para casos de descumprimento das medidas de transparência ou de gastos de 70% da receita sem nenhuma medida de recuperação.

A correção da inflação aos salários dos servidores é prevista na Constituição e pode ser concedida mesmo que ultrapasse os limites da lei, sem punições ao gestor público. Gastos com pessoal para aumentos de salários, além dos 54% permitidos por lei, podem ser recuperados no prazo de oito meses, sem punições. Ou seja, o prefeito tem toda a liberdade para atender as reivindicações agora e ajustar as contas até janeiro. O que é a mesma coisa que conceder o reajuste só no primeiro mês de 2012.

Só não significa a mesma coisa para os servidores. Um trabalhador com um salário de R$ 1 mil, sem 6,5% de correção, deixa de receber R$ 455 até o fim do ano. Isso torna mais difícil arcar com os reajustes do IPTU, da água, do transporte e da cesta básica.

Mesmo sem ainda ter cumprido todos os acordos firmados com a categoria em 2010, Carlito Merss ainda lança a promessa de conceder dois reajustes em 2012. Se esse ano, em que ainda não há impedimentos legais, ele se nega a negociar, como podemos esperar pelo próximo ano? A Lei Eleitoral impede aumentos acima da inflação em anos eleitorais a partir de março e a LRF veda a concessão de reajuste 180 dias antes do fim do mandato. Aliás, a Lei Eleitoral também foi invocada pelo Executivo no ano passado, na sua fracassada tentativa de empurrar somente 1% de reajuste aos servidores.

Além do reajuste, a Prefeitura também pode começar a recuperar perdas históricas da categoria. Os aumentos da receita e a economia nacional apontam que o aumento real é possível, para além da inflação. Prova disso são todas as outras grandes categorias da cidade, que alcançaram aumentos além da inflação este ano.

Dados:

Portal do Cidadão do Tribunal de Contas do Estado

Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar 101 4/5/2000)


Art.22

Parágrafo único. Se a despesa total com pessoal exceder a 95% (noventa e cinco por cento) do limite, são vedados ao Poder ou órgão referido no art. 20 que houver incorrido no excesso:

I – concessão de vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração a qualquer título, salvo os derivados de sentença judicial ou de determinação legal ou contratual, ressalvada a revisão prevista no inciso X do art. 37 da Constituição;

Art. 23. Se a despesa total com pessoal, do Poder ou órgão referido no art. 20, ultrapassar os limites definidos no mesmo artigo, sem prejuízo das medidas previstas no art. 22, o percentual excedente terá de ser eliminado nos dois quadrimestres seguintes, sendo pelo menos um terço no primeiro, adotando-se, entre outras, as providências previstas nos §§ 3o e 4o do art. 169 da Constituição.

§ 3o Não alcançada a redução no prazo estabelecido, e enquanto perdurar o excesso, o ente não poderá:

I – receber transferências voluntárias;

II – obter garantia, direta ou indireta, de outro ente;

III – contratar operações de crédito, ressalvadas as destinadas ao refinanciamento da dívida mobiliária e as que visem à redução das despesas com pessoal.

§ 4o As restrições do § 3o aplicam-se imediatamente se a despesa total com pessoal exceder o limite no primeiro quadrimestre do último ano do mandato dos titulares de Poder ou órgão referidos no art. 20.

Constituição Federal

Art. 37

Inciso X – a remuneração dos servidores públicos e o subsídio de que trata o § 4º do art. 39 somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices;

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