Escola: transformar o sistema ou adaptar-se?

Por Ulrich Beathalter

A profissão do magistério é muito peculiar. Para ser um educador não basta boa vontade. É preciso formação mínima e o compromisso com o aprimoramento constante dos conteúdos e das técnicas do processo de ensino-aprendizagem. Isso não tem a ver com vocação ou destino, mas de busca séria e constante por profissionalizar a atuação do mestre. Ou entendemos isso, ou continuamos a ver a figura do professor como um ser dócil e amoroso, que se doa em favor dos seus alunos, num estereótipo do missionário, desapegado de qualquer anseio pessoal e agarrado apenas à divina missão de servir. Daí alguns depreendem que qualquer um pode ser professor e ensinar, basta ser puro de coração e desejar ardentemente ajudar o próximo.

Essa visão romântica da profissão não ajuda em nada na qualidade do ensino oferecido à população. Esse discurso serve, na verdade, para mascarar o interesse do governo e dos capitalistas em continuar investindo apenas migalhas na educação dos cidadãos e deixar que a própria comunidade assuma a manutenção da escola.

Trabalhar com educação é coisa séria. E é preciso ser um profissional extremamente competente para dar conta das atribuições exigidas no processo. Portanto, é hora de ver o professor não como um coitadinho ou um herói ou um missionário despojado – mas sim como aquilo que ele é: um profissional competente, que estudou para entrar na profissão e que almeja sucesso em sua carreira profissional. Disso depende a qualidade de vida e de trabalho dos nossos mestres e, por consequência, a qualidade da educação das nossas crianças.

A legislação brasileira já deu passos importantes ao reconhecer a importância da profissão do magistério, e vai além ao consolidar a especificidade da atuação dos trabalhadores em educação. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação, de 1996, e a Lei do Piso Profissional do Magistério, de 2008, reafirmam a profissão do magistério e estabelecem regras claras para preservar a qualidade do trabalho dos professores e demais trabalhadores em educação. Antes disso, a própria CLT já reserva capítulo especial ao regramento do trabalho do professor, garantindo férias prolongadas ao trabalhador, no mesmo período das férias escolares dos alunos. A CLT também exige que se limite a quatro consecutivas ou seis intercaladas o número de aulas trabalhadas pelo professor ao longo do dia. Para o profissional da rede pública, a LDB fixa a carga horária em 800 horas de trabalho, divididas em 200 dias letivos, o que daria também 4 horas diárias de trabalho ao profissional da educação.

Por que, então, ainda vemos os calendários letivos serem montados com jornadas superiores? Qual o interesse em impor aos professores uma jornada estressante, muitas vezes maior do que a saúde da maioria das pessoas pode suportar? Por que ainda se trata em separado a Educação Infantil e o Ensino Fundamental, como se não fossem etapas da Educação Básica, indissociáveis no processo de formação do indivíduo?

A resposta é uma só. Ao se montar o calendário, muitas vezes os gestores pouco se preocupam com as especificidades da profissão e mais com a opinião pública e com a possibilidade de algum ganho político para o partido que estiver no poder. Claro, pois todos sabemos que, no senso comum, as pessoas veem com bons olhos se a escola funciona por mais tempo, não porque estão preocupadas com a qualidade do ensino, mas por ter um lugar para deixar as crianças – esses seres em formação, inquietos, ávidos pela descoberta do mundo.

Abrir CEIS em janeiro, no recesso de julho, impor dia da família aos sábados – tudo isso nada agrega de fato na melhoria do processo ensino-aprendizagem. Nada tem a ver com o desenvolvimento cognitivo dos alunos. Interessa apenas a uma demanda política e vem confirmar o fato de que historicamente a escola não tem servido para transformar a sociedade, mas sim para perpetuar e fortalecer o sistema capitalista perverso em que vivemos.

“As mães precisam de um lugar para deixar seus filhos enquanto trabalham”. Esse é o discurso oficial. Essa é a necessidade do sistema para perpetuar sua exploração sobre o ser humano. Infelizmente, os gestores da educação, ao invés de criar os mecanismos para libertar as pessoas do sistema, passivamente subjugam a escola, adaptam-na à necessidade das empresas capitalistas. Mais uma vez, não é o ser humano que importa – e sim que a fábrica não pare, que o lucro do patrão não diminua, que o capitalismo não morra.

Quem pode resistir a isso, em primeiro lugar, são os próprios trabalhadores em educação. Mas, em medida maior, todos os trabalhadores são chamados a combater esse sistema.

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