Cuidando de quem cuida

Este é o segundo texto de uma série de três sobre a saúde do servidor municipal. Hoje, abordarei as doenças osteomusculares em profissionais da saúde. Não pretendo apresentar um texto técnico, mas evidenciar politicamente os problemas que levam os servidores a adoecerem. Temos que entender e explicar a toda população o que leva um técnico de enfermagem, um fisioterapeuta ou um psicólogo a adoecer. Temos que nos defender da chacota que parte da imprensa faz, de forma rasa, ao abordar os atestados no serviço público. E, ao mesmo tempo, denunciar a administração municipal, que deitada em berço esplêndido, nada faz para reverter a situação e ainda alimenta o incêndio de calúnias.

O trabalhador da saúde está exposto a pressões físicas e emocionais no exercício de suas funções. A complexidade e a responsabilidade de suas tarefas os empurram para além do profissionalismo, muitas vezes o servidor se envolve pessoalmente nos problemas de seus pacientes, e essas são características quase inevitáveis.

O tamanho do serviço

Usarei Joinville como exemplo, mas também Garuva e Itapoá têm um qualificado corpo profissional de servidores da saúde, porém em escala bem menor. Em Joinville, são ofertados diversos serviços de saúde. Temos aqui um dos maiores hospitais 100% públicos do país, o Hospital Municipal São José (HMSJ), com atendimento referenciado em oncologia, ortopedia, cirurgia geral entre outros. O HMSJ é um orgulho para o país em captação e transplante de órgãos. Além do pronto socorro do São José, existem outros três prontos atendimentos que 24 horas por dia garantem à cidade o mais experimentado serviço de urgência e emergência.

Joinville tem 56 unidades de saúde básica ou do Programa Saúde da Família, que prestam fundamental serviço à comunidade por ter como vocação agir antes que um paciente adoeça. Existe ainda uma série de serviços especializados, como o SAMU, que atende às demandas de urgência e emergência, o Centrinho Luiz Gomes que atende pacientes com fissura lábio-palatal ou com problemas auditivos, o NAIPE que fornece atendimento a pacientes especiais, os CAPS que junto do PAPS acolhem e encaminham pacientes com dependência química e distúrbios psiquiátricos. Sem falar da odontologia especializada, a vigilância sanitária, a vigilância epidemiológica e muito mais.

A estrutura

É muito difícil, em apenas um parágrafo, resumir os serviços de saúde de Joinville. Porém, mais difícil mesmo é trabalhar na saúde pública do município. Apesar da grande demanda de trabalho em todas as unidades (isso mesmo, todas), encontramos problemas graves de estrutura física, falta de profissionais, de materiais ou até mesmo de equipamentos. Alguns locais os profissionais praticamente levam nas costas, pois a unidade deveria estar fechada devido às absurdas condições de trabalho.

Técnicos de enfermagem atendendo 15 pacientes em unidades de internação. Cadeiras de rodas e macas apodrecidas, emperradas pela falta de manutenção, impondo uma sobrecarga de trabalho monstruosa e desnecessária. Unidades que incendeiam por curto circuito, que são interditadas pela Vigilância Sanitária, que não oferecem acessibilidade (não raro os servidores carregam pacientes no colo). E, claro, o tradicional assédio moral, praticamente institucionalizado através do uso indevido das “medidas corretivas” e dos “termos de ajuste”. Além disso, assim como em toda a categoria, a ausência de uma política de ginástica laboral, jornadas de trabalho de até 42 horas semanais e inexistência de um setor de medicina do trabalho transformam-se em diversas doenças ocupacionais.

O resultado

Essa exposição dos trabalhadores a condições de trabalho extremamente inapropriadas vem criando uma epidemia de doenças osteomusculares. Os sintomas iniciam com sensações de peso e dormência em regiões específicas, evoluem para um dor eventual até a perda da força, com uma dor aguda e bem localizada. Assim se desenvolvem as Doenças Osteomusculares Relacionadas ao Trabalho (DORT). Segundo pesquisa publicada em abril de 2006 pela Revista Brasileira de Enfermagem, 78% dos afastamentos por DORT são da equipe de enfermagem, seguido pelos serviços complementares (fisioterapia, fonoaudiologia, nutricionista, entre outros), equipe administrativa e, por último, dos médicos. Do total de afastamentos de profissionais da saúde, as doenças osteomusculares lideram com 14,68%. Há escassez de pesquisas sobre o assunto e esses números podem variar em função de características regionais, mas eles ilustram bem o que vem acontecendo.

Quem sempre cuidou da saúde dos outros com dedicação e carinho, não recebe o mesmo cuidado do seu empregador. Tratados como máquinas substituíveis, descartáveis, os trabalhadores da saúde precisam se impor.

Enquanto as condições ideais de trabalho não são oferecidas, temos que nos preservar. Temos que nos negar a trabalhar em condições precárias ou de risco. Inclusive isso faz parte da responsabilidade profissional. Trabalhar em situações que prejudiquem o bom desenvolvimento de suas funções pode levar o profissional ao erro. E dificilmente isso será considerado em um processo administrativo e judicial.

Por melhores e dignas condições de trabalho!

Por um programa de ginástica laboral!

30 horas semanais para todos!

Por um verdadeiro serviço de medicina do trabalho!

Lutemos!

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